sábado, 30 de abril de 2011

Conto - Ana Guimaraes - As Gargulas - A Casa da vovó

     A tempestade fustigava a janela, impiedosamente. Pamdora treme a cada trovão que irrompe no céu, sempre precedido por um clarão, que penetra pelas frestas das venezianas iluminando o pequeno quarto na casa da avó. Em sua casa, no tem medo de chuva forte, porque os pais dormem no quarto ao lado, ao alcance de sua voz. Mas, no sobrado antigo, a menina está no andar térreo, enquanto a avó dorme acima da escada.
     Para piorar as coisas, a natureza chama e Pamdora precisa ir ao banheiro no fim do corredor, apesar de estar morrendo de medo. Retira os pés de dentro das cobertas, tateando atrás das pantufas em formato de coelho. Coloca por cima do pijama de pelúcia estampado um chambre amarelo combinando.
     Os passos suaves fazem ranger a madeira das tábuas, o cheiro de alfazema é quebrado pelo ozônio dos relâmpagos. Lá fora, a calha despeja água como uma cachoeira, só piorando a necessidade da menina. Ainda assim, ela caminha devagar, assustada com o ruído dos próprios passos.
     Sai da sala em frente ao quarto e entra no corredor, acende a luz, pois a luminosidade do quarto não chega até ali. Quando alcança a metade do caminho, um raio por um trovão apaga todas as luzes da rua. Agora no escuro, a menina pensa, basta seguir em frente, com as pantufas arrastando no chão.
     Chega até a porta entreaberta e entra no banheiro, quase tropeça do chão, mais alcança o vaso. Mais aliviada, hesita entre ficar onde está, esperando a volta da luz, ou ir para o quarto. As pálpebras começam a pesar, o frio e a umidade alcançam os ossos, se convence de que precisa voltar para a cama. A água gelada queima a pele, mas o sabonete da vovó é familiar, pensa a menina, lavando as mãos.
     Novamente arrastando as pantufas, dá alguns passos, enquanto os braços buscam a porta. No corredor escuro, Pamdora desliza as mãos nas paredes, o coração disparado. Quando um relâmpago despeja uma réstia de luz na sala em frente, um vulto surge, somente por uma fração de segundo e a escuridão a envolve novamente. Grita. mas seus pés parecem fincados no chão. Sente alguém segurar seu braço, falando palavras incompreensíveis. O pânico toma conta de seu corpo e ela cai, desacordada. Quando abre os olhos, percebe que está na cama quentinha, e o resto bondoso da avó está ao seu lado, uma lanterna sobre a mesa de cabeceira faz desenhos na parede.
     - Tinha alguém lá embaixo, eu vi.
     - Não precisa ficar assustada, era apenas o espelho inquietando o fundo do corredor.

2 comentários:

  1. Este é muito engraçado, mas não ha nada como sermos protegidos e cuidados por aqueles que nos amam. A proteção e o carinho são uma forma de demonstrar o amor que temos sem cobranças e medos,faz- nos pensar em como são frágeis nossos sentidos. Lindo e reflexivo este conto continues assim heheh ! Camila Oliveira

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  2. Amei esse conto! Vou procurar por mais! Muito obrigada por escrever tão ricamente!

    Rossinês

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